quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Minha vida em uma música

Tenho uma ligação muito, muito forte com a música. Essa ligação não se deve somente ao fato de minha mãe ser uma pianista e regente, todos os meus irmãos serem músicos profissionais e eu mesma já ter sido uma violinista, nem ao fato da música fazer parte da minha vida, do meu cotidiano. Vai muito além disso.

Minha ligação com a música é uma ligação de alma, algo visceral. Nada, absolutamente nada me toca tão profundo, me alcança tanto, quanto a música. A música fala comigo, e eu converso com ela. A música me entende, me acolhe, me aquece, me anima, me diverte, me abraça, me alegra, me repreende, me sensibiliza, me endurece... Incontáveis vezes ela consegue contar através de suas letras os meus sentimentos, meus pensamentos, quem eu sou, do que eu preciso, do que eu gostaria. Coisas que eu mesma não consigo dizer. A música vai até o meu coração de um jeito que nada mais vai.

Muitas músicas preferidas me acompanham ao longo da vida, em diferentes fases e circunstâncias. Nunca sei dizer qual é a minha número 1 e acho que ela não existe, mesmo. No meu coração, todas as minhas preferidas podem ter o 1º lugar. Dentre elas, tem uma muito especial e eu resolvi dividir aqui. Ela vale a atenção de vocês, acreditem.

Conheci “Both Sides Now” em 2003, através da cena do filme “Love Actually” em que a personagem Karen (Emma Thompson) conclui que seu marido Harry (Alan Rickman) está traindo-a. Karen, sozinha, reflete por segundos nessa dolorida constatação e as lágrimas escorrem enquanto ela ouve a primeira canção de seu presente de Natal. Ao fundo, a voz de Joni Mitchell caracteriza perfeitamente todo o peso e a dor do momento. Logo que terminei de ver o filme, fui atrás da letra. Quando encontrei, tive a sensação de ler a minha vida e meus pensamentos sobre ela através dessa música. Foi um encontro muito forte. A interpretação de Joni Mitchell triplicou o peso desse encontro, e desde então, essa tem sido uma das músicas da minha vida. Ela tem me acompanhado por quase 8 anos, e eu gostaria muito de levá-la comigo para o resto da vida. Cada vez que escuto, cada ano, cada época, cada momento da minha vida dou um significado diferente à ela, mas sempre concordando e me surpreendendo com o quanto ela fala sobre mim.

Joni Mitchell gravou “Both Sides Now” pela primeira vez em 1969. Gravou-a novamente em 2000, e o peso dos anos vividos entre uma gravação e outra fez uma diferença brutal na interpretação da música. Cantar estas palavras aos 57 anos é muito, mas muito diferente do que fazer isso aos 26, e acredito que essa diferença tenha sido crucial pra fazer dessa regravação um conjunto perfeito de letra + melodia + interpretação. Ouvi Joni Mitchell dizer num documentário que ela se emocionou muito ao regravar esta música, que foi uma experiência muito forte. Percebo perfeitamente na voz dela que foi mesmo, e talvez esse seja apenas mais um dos motivos que fazem com que essa música me emocione tanto. 

Com vocês, portanto...


BOTH SIDES NOW
Joni Mitchell

Rows and flows of angel hair
And ice cream castles in the air
And feather canyons everywhere
I've looked at clouds that way

But now they only block the sun
They rain and they snow on everyone
So many things I would have done
But clouds got in my way

I've looked at clouds from both sides now,
From up and down, and still somehow
It's cloud illusions I recall
I really don't know clouds at all

Moons and Junes and ferries wheels
The dizzy dancing way that you feel
As every fairy tale comes real
I've looked at love that way

But now it's just another show
And you leave 'em laughing when you go
And if you care, don't let them know,
Don't give yourself away

I've looked at love from both sides now,
From give and take, and still somehow
It's love's illusions that I recall
I really don't know love
I really don’t know love at all

Tears and fears and feeling proud
To say "I love you" right out loud
Dreams and schemes and circus crowds,
I've looked at life that way

Oh but now old friends they are acting strange
And they shake their heads, and they tell me that I've changed
Well something's lost but something's gained
In living every day

I've looked at life from both sides now,
From up and down, and give and take, win and lose, and still somehow
It's life's illusions that I recall
I really don't know life at all

It's life's illusions that I recall
I really don't know life

I really don't know life at all…

10 comentários:

  1. sem nada a acrescentar. uma música que você acaba de dividir comigo. pra vida toda.

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  2. Chego aqui vindo de um tweet (tuíte? desculpe, moro nos Estados Unidos) da Dani. Concordo com você plenamente sobre esta música e a conheci (e, por consequência a Joni Mitchell) também no filme Love Actually. Perguntinha... você já ouviu outros discos e obras dela? O disco Both Sides Now tem uma produção maravilhosa, mas só tem 2 composições dela -- fico dividida entre "Both Sides Now" e "A Case of You," que é absurdamente linda. Bom, é apenas curiosidade. Desde q descobri a Joni eu escuto a música dela e fico abismada pensando que eu estava nascendo (71) e ela escrevendo estas canções q são eternas e que são tão significativas 40 anos depois do q quando compostas.

    A vida dela é fascinante também. Ela deu uma filha pra adoção (escreveu uma canção a respeito: "Little Green") e anos atrás reencontrou-se com ela. Tem um documentário muito bom que mostra isso. Bom, eu escrevo demais e já vou parando, mas não poderia deixar de comentar. Agora vou ter q ouvir a música antes de dormir. :) (as duas, aliás). Lindo o visual do seu blog. Eu queria ter talento pra mexer no visual do meu... mas... não tenho tempo!

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  3. Oi Lana! Se você quiser, você pode comentar aqui no seu blog mesmo de volta, q eu venho conferir. Mas obrigada por comentar lá no meu! (no meu post mais sem graça dos últimos meses ;-)

    O DVD chama-se: Joni Mitchell - Woman of Heart and Mind: A Life Story (2003). Você sabe que ela é pintora, né? E a capa do CD q vc menciona no post foi pintada por ela. Inclusive tem outro documentário: Joni Mitchell: Painting with Words.

    Ela tem um website muito bom também, com muitas informações: http://jonimitchell.com/

    Sobre a música "A Case of You," no YouTube infelizmente não tem a versão do disco A Case of You que, como você tão bem comentou, é bem diferente cantada 30 anos depois! (fora a orquestração que é estupenda). Tente conseguir!! A versão original (q realmente é bem diferente da do disco recente) está aqui: http://www.youtube.com/watch?v=0YuaZcylk_o

    Essa música é bem conhecida, tanto a Diana Krall como a Tori Amos tem covers dela (tem no YouTube), mas nada como o original!! (na versão orquestrada).

    Bom, eu tenho q ir arrumar minha casa q está uma bagunça e preparar o jantar, mas a gente vai se falando!!

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  4. Nana,

    lembro bem de quando você ouviu essa música, o contexto impressionantemente coincidente.

    Sei, e fico pensando, também, essa sua relação com a música - não apenas esta, mas com música em geral... Sim, a música é visceral pra gente: entra pelos ouvidos, cochicha nas idéias e antes mesmo que tenha formado palavras nos pensamentos, já reverbera pelas glândulas, faz tremer os músculos, tranca a garganta. Já o quanto a letra fala por nós vai do quanto é boa a poesia em se prestar a suporte de nossas diferentes leituras sendo ainda assim eficiente - quanto mais amplas e bem estruturadas as metáforas, portanto.

    Mesmo com todas as metáforas que essa música contém, para mim parece que o foco principal de vários sentidos da letra é o do processo ou momento da desilusão. As nuvens como uma das metáforas das ilusões ingênuas (angel hair rows, ice cream castles, feather canyons etc) que impedem de olhar pro sol etc. Bem... Acho que um dos grandes passos de 'adultecer' é o de entender de fato esse grande assunto que é ilusão-desilusão. Por ilusão podemos pensar 'idealização'. Quando nossa idealização se quebra em nós mesmos, chamamos de desilusão; quando localizamos o processo no outro, chamamos de decepção. Digo que isso é um processo de adultecer porque é quando precisamos lidar sozinhos com a dor de não termos nossas expectativas atendidas. Quando somos crianças e nossas vontades não são feitas, nossas expectativas frustradas, choramos para mãe e pai. Adultecer tem isso de aprender a chorar sozinho, de certa maneira - a lidar sozinho com isso - partindo do fato de que somos nós os responsáveis pelas expectativas que criamos. Às vezes ficávamos ressentidos com alguém que 'nos decepcionou' porque agiu contrariamente ao que esperávamos. Muitas vezes recobrimos uma pessoa com uma linda pintura de ouro, alçamos num pedestal e esperamos que permaneça ali para satisfazer nossa admiração. Mas é uma pessoa, e, por isso, vive, se mexe, não fica parada na posição que gostaríamos. E aí trinca a pintura, começam a cair os pedaços da tinta de ouro, e vamos recolhendo os pedaços inconformados e tristes com aquela destruição... É um momento, este. O momento de entendermos que temos uma escolha a fazer - queremos que faça parte de nossa vida uma tentativa irreal escultórica ou UMA PESSOA: do que fazemos mais questão? de lamentar os cacos do que aprontamos ou de comemorar a realidade da pessoa? Às vezes é preciso entender as decepções como libertações - não só pra si, mas libertações do outro pra que seja humano em nossa vida; entender as decepções não como a perda de algo (porque irreal), mas o ganho de algo (real). Abraçar a decepção perdoando gentilmente não o outro, mas a si mesmo por ter inventado a ilusão que ali se perdeu para, assim, ganhar de fato um outro real.

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  5. O mesmo vale de nós para nós mesmos. Comecei falando de outro porque é mais fácil 'visualizar' o processo retirando-o de si e polarizando-o num outro. Mas é exatamente o mesmo conosco. Nos idealizamos, muitas vezes. Queremos crer que podemos viver pintados de ouro aqui e ali. E nos movemos e quebramos. E o que preferimos? O ouro que inventamos, ou nossa pele? Viver é melhor que sonhar. Nossas falhas, reais, são, por isso, muito mais interessantes que nossas irrealidades. Portanto, redescobrir amar a nossa pele, que é a que somos. É isso que quero dizer com dar beijinhos no próprio ombro. Eu sei que você vai achar a coisa mais engraçada ouvir isso DE MIM, mas aí vai... Pense no cerne mais autêntico do pensamento religioso que você conheceu durante toda sua vida - você tem certeza que já parou pra pensar nele pra valer?
    1. Amar Deus acima de todas as coisas.
    2. Amar o próximo como a ti mesmo.
    Posso reformular 'amar Deus' de uma maneira que é como penso e que continua sendo verdadeira pra você - 'ama o que é tua origem, tua essência, o que de que você foi feito e que é o sentido de tua vida'. Mesmo isso sendo tão profundo, creio que sem analisar tanto é possível pra você imaginar as implicações disso. 'Amar Deus', assim, é o que preenche de sentido o seu amor por você mesma porque de certa maneira explica o que você é, qual o mérito da sua existência.
    Por incrível que pareça, é na segunda parte que as pessoas menos prestam atenção: 'ama o próximo como a ti mesmo'. Talvez se simplesmente invertêssemos a ordem da frase, já reparariam melhor: 'como a ti mesmo, ama o próximo'. Ou seja, ama primeiro a ti mesmo, e que seja o teu amor por ti mesmo o parâmetro para amar o outro. Ou seja, só amamos o outro conforme nos amamos; o nosso amor ao outro é determinado pelo nosso amor a nós mesmos. Portanto teremos condições de amar saudavelmente o outro quando o nosso amor por nós mesmos for primeiramente saudável. Em tempos de tanta falta de amor-próprio, o que se encontra tanto e demais é um falso amor ao outro que nada mais é do que a dependência de que o outro supra em nós a falta de amor que temos por nós mesmos - e isso é doença, não amor, e disso só advém mais doença, e não mais amor. Da mesma maneira, lidar conosco mesmos nesse processo de compreensão de nossas idealizações e suas quebras é algo que só é possível como parte de nosso amor-próprio. Para, no fim, podermos saudavelmente preferir nossa pele, e beijá-la - e, assim, podermos beijar também a pele do outro.

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  6. Por fim, dando o nó, a verdade também é que ninguém vive sem nuvens. Olhar para o sol direto fere a vista. Sabemos do circo da vida, e não é porque nosso amadurecimento nos faz ver as realidades em detrimento das ilusões que, por isso, devamos SEMPRE e irrestritamente desejá-las. Não é todo palhacinho que é bonitinho por aí, como você já sabe bem. A realidade das pessoas, assim como a nossa, também é incômoda e indesejável, às (muitas) vezes. Conosco mesmos, temos que lidar, tentar mudar o que dá, acomodar, ponderar, tornar socialmente ou intimamente aceitável ao menos. E, se não podemos fazer isso conosco mesmos, por amor a nós mesmos, tem gente de que abriremos mão justamente por amor a nós mesmos. Por outro lado, um tiquinho de nuvem é bom, sim. Sempre. Viver é muito melhor que sonhar, como eu disse, mas não se vive sem sonhar. Não é uma má política, portanto, esperar pelo melhor, desde que não se esteja tão vulnerável à possibilidade da ocorrência do pior. 'Hope for the best but prepare for the worst' talvez fosse melhor dito 'always prepare for the worst but keep hoping for the best'. Se não esperarmos que as pessoas (inclusive nós mesmos) sejam melhores do que a realidade que delas compreendemos, se não damos esse espaço, essa margem, como melhorarão? Continuo achando que vale a pena sonhar e idealizar, sim, portanto, desde que não sejamos mais ingênuos nem desavisados, desde que nos amemos saudavelmente e, assim, possamos dividir isso com o outro. É estar de bem consigo mesmo num sentido muito profundo, e, assim, ver cabelinhos de anjos nas nuvens com a cabeça apoiada na da pessoa que você ama, os dois apontando juntos, e rindo.

    Um beijo.

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  7. Lana e Ernani,

    Primeiro que música, que cordas, que percepção...

    Segundo, que bela interpretação do Ernani, sobre desilusões e a letra em si.

    Desilusões só são descobertas após alguma coisa, apoós a expectativa; sem a expectativa não é possível ter a desilusão.

    Sonhos infantis são vistos quase sempre como impossíveis, por virem de uma mente sem limites de possibilidades e eles não costumam se realizar, por serem literalmente sonhos. Mas uma criança precisa sonhar para instigar sua criatividade.

    Acontece que quando crescemos, aprendemos a sonhar de verdade. Idealizamos o que parece estar ao nosso alcance, fazemos planos nos baseando na nossa realidade e esquecemos que sonhos são sonhos e normalmente eles não acontecem e quando acontecem, acontecem de uma forma diferente, acrescentando obstáculos e imprevistos.

    Isso tem muito a ver com o próximo porque o nosso sonho idealizado só existe em nossa mente; uma junção de conceitos inseridos no subconsciente+cultura+personalidade. E transferí-lo completamente para outra pessoa é algo impossível. Porém, encontrar alguém que esteja disposto a amar e te ajudar a facilitar esse processo já é um grande presente.

    Por isso também que Deus nos orienta a vivermos os caminhos dEle, pois Ele conhece ambos os corações e sabe qual o melhor caminho a trilhar na companhia de alguém.

    Isso é uma constante luta de auto análise de vida e conceitos, que ao lado de alguém disposto a amar, geram boas mudanças , visando a melhor convivência entre ambos.

    Também não entendo muito bem o conceito de amar ao próximo como a ti mesmo, porque não é sempre que sinto um "auto-amor", por isso, tento redefinir o termo para: Priorize o próximo como a ti mesmo. Ou, me deixo fluir e simplesmente amo o próximo.

    Mas aí também existe uma concepção de próximo, um pensamento de quem é o próximo? Quem está longe? Quem é a metade de ti, mais do que próximo?

    Por isso, acredito que se permitir amar e tentar estar próximo do máximo de pessoas que puder é um caminho saudável.

    Mas no final, pessoas e decepções estão tão interligadas como pessoas e o amor.

    E já dizia C.S.Lewis "Amar é sempre ser vulnerável. Ame qualquer coisa e certamente seu coração vai doer e talvez se partir. Se quiser ter a certeza de mantê-lo intacto , você não deve entregá-lo a ninguém , nem mesmo a um animal... "

    No final das contas, aprender a lidar com a decepção vale mais a pena do que deixar de amar. E melhor ainda, encarar a decepção como uma expectativa errada. Algo que aprendi com a sua mãe e ela nem sabe: "Que nunca esperou algo, sendo assim, sempre se surpreendeu"

    Isso é um pensamento sábio, de quem aprendeu melhor a viver. E se permitiu amar, deixando de lado a casa das desilusões.

    beijos

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  8. Hum...

    Quem me conhece sabe que dificilmente deixo algo no ar, se tenho a oportunidade de não o fazer, e a permissão da conveniência.

    O tal do auto-amor... Não foi à toa que eu disse que o primeiro ponto é 'ama Deus acima de todas as coisas', e identifiquei isso como o amor à nossa essência, o que nos gerou e criou e que é o sentido e mérito de nossa vida. Deus é perfeito, é amor, e é a fonte criadora de vida. Faz parte da essência de Deus, em sua plenitude, amar e, por isso, expandir-se. Da mesma maneira, o amor em nós é conforme a nossa plenitude de nós mesmos, é um indício de nossa saúde (num sentido bem amplo); nossa vontade de nos expandir é um indício de quão bem anda (ou não) essa saúde. Ser saudável não significa não ter problemas, assim como para um corpo não significa não ter bactérias em si, mas sim se essas bactérias estão em equilíbrio ali, se o corpo lida bem com elas e funciona com elas. Um ser vivo saudável é portanto o que funciona bem, equilibrado, lidando bem com o que é, com a complexidade que reune em si, e que assim cresce e se expande como conseqüência natural do que é. Assim também, quando o nosso amor é pleno em nós (quando estamos saudáveis conosco mesmos), quando esse amor em seu movimento natural de expansão quer continuar o seu sentido, este é o momento que os nossos limites, ampliados, encontram e tocam o outro.

    O outro é o que está além de nossa pele, assim como 'eu' sou o que está da minha pele pra dentro. Acho que a idéia de considerar o outro como metade de si nada mais é do que o indício de uma visão de si como incompleto para si mesmo. Um amor saudável não é o que busca no outro o que lhe falta (isso é carência, deficiência, não amor), mas o que lhe enriquece, complementa, e, mais ainda do que o que espera receber, o que deseja DAR. Amar não é buscar outra pessoa que pareça adequada para cumprir a tarefa de completar a sua vida incompleta, mas tem mais a ver com querer ser mais com outro, e fazer-se assim a si e ao outro mais feliz - mesmo apesar de nossas incompletitudes. Acho que um amor saudável é o que acontece entre duas pessoas que não querem encontrar uma metade de si, mas um outro pleno - com todas as complexidades dessa plenitude, com todas as bactérias que ambos carregamos e com as quais lidamos. Beijar na boca, trocar bactérias, tudo isso é amor e saudável, é enriquecer o sistema imunológico de ambos compartilhando não necessariamente anti-corpos, mas problemas que estimulem o nosso organismo a se desenvolver mais para lidar com eles. Do que é bom e encantador nem é preciso dizer nada - nada é mais delicioso do que o quanto nos encantamos com as riquezas que o outro traz para nossas vidas: que não precisa ser o resultado de pilhas de livros ou anos na universidade, mas eventualmente um jeito de sorrir, um senso de humor. Esses dois que são dois inteiros e não duas metades se encontram e formam uma nova entidade, o casal, a qual se torna maior do que a simples soma dos dois separados e se reflete também nas individualidades da mesma maneira. O funcionamento dessa entidade simbiótica é o mesmo de um organismo: conforme se ama, conforme o seu amor cresce, é assim que se mede sua saúde - e a conseqüência natural dessa saúde é a expansão. E, da mesma maneira como a essência do amor é criativa, a expansão natural do amor de um casal acontece quando o amor de ambos, o amor do casal é tanto que precisa ser mais. Este é o momento do filho que vem como conseqüência do amor. E nosso amor, esse mesmo amor que nos permeia desde nossa origem, cria mundos.

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  9. Por fim, o nó: até mesmo Deus, que vive na eternidade, 'sonha'. Porque sonhar é desejar projetivamente e esperar. Deus criou o mundo, segundo a Bíblia, 'para louvor de sua Glória' - para sua felicidade, em termos pedestres - e sempre o aprendemos como querendo muito que as coisas dêem certo afterall. Nem dou bola pra idéia de um Deus carente e por isso criador, não. Ao contrário do que a lógica psicanalítica diria por um viés negativo, que o desejo existe enquanto carência, prefiro entender que 'carência' é um modo muito parcial de nomear a complexidade do processo de nossa vida - nossas células estão o tempo todo morrendo e outras são geradas, nosso corpo absorve o alimento e o aloca onde o processo de aproveitamento solicita por sua própria natureza química, elétrica. Assim como carência é, portanto, intrinsecamente ligada ao desejo, outros dois conceitos também o são, e, a meu ver, retratam mais completamente aspectos fundamentais de nosso comportamento: manutenção e expansão.

    Para nos mantermos, muitas vezes evitamos os riscos e ponderamos os sonhos; para nos expandirmos arriscamos seguir nossos sonhos. E ambas as coisas são fundamentais e sem elas não se vive... Porque quem não se move a se expandir, na verdade definha - e quem se preocupa apenas em se manter, na verdade já está de certa forma morto, porquanto a vida é movimento.

    Quem nunca esperou nada certamente não viveu plenamente, não se amou de verdade primeiramente, foi apenas um corpo conduzido por suas células, como um boneco gigante balançado pelas ruas pelos foliões que o recheiam. E a alegria da saúde está lá dentro. Ouvir nossas células, cuidar de sua saúde, olhar com amor como querem se manter e se expandir, e abraçar a vida que vive em nós e debaixo de nossa pele é um ótimo começo pra mudar o último verso da música.

    Um beijo.

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  10. Gente, adorei os comentários, pensamentos, pontos de vista, reflexões, dicas de música, um pouquinho de cada um...adorei!! O conteúdo que vcs trouxeram fez valer à pena o post!! A vida, as decepções, o amor, vistos do ponto de vista de pessoas diferentes, sempre acrescentam muito.
    Todos os comentários foram devidamente apresentados ao conteúdo da caixinha maluca de pensamentos da Dona Lana, e estão todos agora juntos brincando, interagindo e se misturando.
    Obrigada a todos, suas elocubrações são sempre bem-vindas aqui!!! :-)

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